segunda-feira, 14 de março de 2011

NOSSOS REMOS - Por Gecildo Queiroz

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NOSSOS REMOS

Por Gecildo Queiroz

 "Cada um deve remar como os remos que tem", diz um ditado popular. Ele não diz: remem com os remos dos outros ou roubem os remos do próximo, tenham inveja deles e, logo em seguida, faça-os em pedaços. Muito menos diz pra comparar os nossos com os de outras pessoas (embora a gente compare assim mesmo).

Se a vida fosse uma espécie de rio largo. Se as nossas realizações estivessem em suas margens e tivéssemos apenas um barco e dois remos, o que faríamos? Obviamente remar em direção à terra firme. Na vida real as coisas mudam de figura, são mais complexas. As possibilidades, adequadas ou não, são muitas, como disse no início do texto. Uma coisa é certa: não usar os nossos remos nos distancia muito do que chamamos de realização.

Não temos garantia de nada. Se felicidade existe, só pode ser conhecida no íntimo, se for construída com o material que temos em nós. Ou seja, nossos remos, mesmo sendo precários. Só eles podem nos botar na cabeça que a nossa vida não é o palco que o outro pisa para ser feliz, nem o outro é o palco para tornar isso possível. O outro pode compartilhar da nossa felicidade, mas não é ele quem a constrói. No máximo, pode fazer a gente perceber que é preciso ser mais do que uma simples coisa. Não é o outro que nos torna pessoa, isso é tarefa nossa. Ele vai apenas reconhecer aquilo que nos tornamos. E, dependendo da conveniência dele, vai estimular a continuação da pessoa ou da coisa que escolhemos ser.

Não sabe se expressar, trate de aprender. Precisa escrever, comece a ler e volte a rabiscar. Quer voltar a estudar, vai se sentir um imbecil, achar que não sabe mais nada, mas cada coisa que a gente aprende faz diferença. Quer mais amor, ame a você e seja amável. Quer ser admirada, saia do aparente, surpreenda. Se a pessoa em questão não quer seu amor, procure quem queira. Se não tem beleza física, bote beleza na alma, nas palavras. Acha que para mim tudo é fácil, tenha certeza que não. Se quiser a fórmula, não tenho. Mas se sua vida é amarga, faça alguma coisa, sei lá, vá comer doce de mamão.

Se decidirmos usar nossos remos, devemos saber que não temos braços iguais, a mesma agilidade e temos ritmos diferentes. Remamos menos ou mais rapidamente. Levamos mais tempo pra chegar que outros e nos distraímos com a paisagem enquanto para outros só a chegada importa. Não existe uma única forma de remar. Contudo existe a pior forma de conduzir o barco (ou não conduzir): permitir que outros neguem a existência dos nossos remos. Quando os outros conseguem nos convencer de que nossos braços são inúteis, teremos cada dia mais dificuldade em tudo.

Se não usar seus remos, vai permitir que tomem conta de sua vida. E, como a sua não é a vida do outro, a qualquer momento o outro pode abandonar a sua. E você ficará com remos estranhos na mão, como se não fossem seus. Ainda assim, você pode retomar a posse dos seus despedaçados e esquecidos remos e começar de novo.
A vida é incerta, os dias ruins e sem vento vão chegar e exigir mais de nós. Não aceitar isso é sofrer em dobro. Como diz outro ditado, "quando não houver vento, reme". Portanto, não devemos esperar os ventos favoráveis, vindos do acaso ou dos outros, devemos usar, urgentemente, os nossos intransferíveis remos.


Gecildo Queiroz é cronista, escritor, humorista e professor.

Um comentário :

  1. Porra, alegoria muito bem construída, apesar do didatismo (nem sei se o uso da conjunção adversativa, neste contexto, está adequada, afinal didatismo seria propriamente aqui uma espécie de defeito?), o que é compreensível por uma dupla razão: o traço professoral, aliado ao receio de que não seja bem entendido se não for tão claro. Eu jamais conseguiria escrever um texto assim. Parabéns!

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